Consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes de Enfermagem

Consumo de bebidas alcohólicas en estudiantes de Enfermería

Consumption of Alcoholic Beverages among Nursing Students

Recibido: 3 de diciembre de 2012
Enviado a pares: 11 de febrero de 2013
Aceptado por pares: 23 de mayo de 2013
Aprobado: 6 de junio de 2013

Rafael Tavares-Jomar1
Enéas dos Santos-Silva2

1  Enfermeiro. Doutorando em Saúde Coletiva. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Rio de Janeiro, Brasil.
rafaeljomar@yahoo.com.br

2  Enfermeiro. Especialista em Enfermagem Intensiva de Alta Complexidade. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Rio de Janeiro, Brasil.
eneas2109@yahoo.com.br

Para citar este artículo / To reference this article / Para citar este artigo

Tavares Jomar, R., Dos Santos Silva, E. (2013). Consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes de Enfermagem. Aquichan. Vol. 13, No. 2, 226-233.


RESUMO

Objetivo: o consumo de bebidas alcoólicas entre os estudantes universitários tem se tornado uma preocupação crescente nos últimos anos, por isso este estudo foi desenvolvido com o objetivo de identificar o consumo dessa substância psicoativa entre estudantes de enfermagem. Método: trata-se de estudo epidemiológico descritivo do tipo transversal desenvolvido em uma universidade privada da cidade do Rio de Janeiro, Brasil, com 161 estudantes que responderam a um questionário autoaplicável que continha informações socio-demográficas, perguntas selecionadas do Alcohol Use Disorders Identification Teste outras sobre aspectos relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas. Resultados: alta proporção (67,7%) dos estudantes de enfermagem entrevistados referiu ser consumidora de bebida alcoólica, sendo que 32,1% deles faziam consumo no padrão binge, e quase metade (45,9%) dos consumidores estava exposta ao risco de desenvolvimento de problemas relacionados ao consumo dessa substância. São preocupantes as informações sobre o consumo de bebidas alcoólicas dos estudantes de enfermagem participantes desse estudo, já que eles são futuros profissionais que, inevitavelmente, atuarão como educadores e motivadores para a adoção de condutas saudáveis pela população. Conclusão: portanto, são necessárias políticas e programas de prevenção ao consumo excessivo de álcool para este segmento populacional.

PALAVRAS-CHAVE

Consumo de bebidas alcoólicas, estudantes de enfermagem, estudos transversais, Brasil, enfermagem. (Fuente: DeCS, BIREME).

RESUMEN

Objetivo: el consumo de alcohol entre los estudiantes universitarios se ha convertido en una preocupación creciente en los últimos años, por lo que este estudio fue desarrollado con el objetivo de identificar el consumo de esta sustancia entre los estudiantes de enfermería. Método: se trata de un estudio transversal desarrollado en una universidad privada en la ciudad de Río de Janeiro, Brasil, con 161 estudiantes que respondieron a un cuestionario autoadministrado que contiene información sociodemográfica, preguntas seleccionadas del Alcohol Use Disorders Identification Testy otros aspectos relacionados con el consumo de bebidas alcohólicas. Resultados: alta proporción (67,7%) de los estudiantes de enfermería entrevistados reportó ser consumidores de alcohol, y el 32,1% de ellos estaban en la orgía de consumo estándar, y casi la mitad (45,9%) de los consumidores están expuestos al riesgo de desarrollar problemas relacionados con el consumo de esta sustancia. Resultados: están preocupados por el consumo de bebidas alcohólicas de los estudiantes de enfermería que participaron en este estudio, ya que son los futuros profesionales que inevitablemente actúan como educadores y motivadores para la adopción de conductas saludables en la población. Conclusión: por lo tanto, se necesitan políticas y programas para prevenir el consumo excesivo de alcohol en esta población.

PALABRAS CLAVE

Consumo de bebidas alcohólicas, estudiantes de enfermería, estudios transversales, Brasil, enfermería. (Fuente: DeCS, BIREME).

ABSTRACT

Objective: Alcohol use among college students has become a growing concern in recent years, and this research was developed specifically to identify alcohol consumption among nursing students. Method: It is a cross-sectional study conducted at a private university in the city of Rio de Janeiro (Brazil), with 161 students who answered a self-administered questionnaire containing socio-demographic information, questions selected from the Alcohol Use Disorders Identification Test, and other aspects related to the consumption of alcoholic beverages. Results: A high proportion of the nursing students interviewed (67.7%) reported being drinkers, with 32.1% being in the binge-drinking category. Nearly half (45.9%) are at risk of developing problems related to alcohol consumption. There is concern about drinking among the nursing students who participated in the study, as they are future professionals who inevitably will serve as educators and motivators for the adoption of healthy behavior on the part of the population. Conclusion: Therefore, policies and programs are needed to prevent excessive alcohol consumption among nursing students.

KEYWORDS

Alcohol drinking, students, nursing, cross-sectional studies, Brazil, nursing. (Source: DeCS, BIREME).



Introdução

O consumo de álcool e suas consequências adversas é um tema de relevante preocupação para a saúde pública, dados os quase 2 bilhões de pessoas consumidoras existentes no planeta e seu impacto sobre os indivíduos e sociedade, expresso por cerca de 2,5 milhões de mortes anuais em todo o mundo, incluindo as de 320 mil jovens com idades entre 15 e 29 anos, devido ao seu consumo abusivo (1).

Em alguns países, há evidências de que os jovens estão começando a beber cada vez mais cedo (2). Isso torna a problemática do consumo de álcool ainda mais grave, visto que seu início precoce está associado a uma maior probabilidade de problemas relacionados ao seu consumo e de desenvolvimento de dependência alcoólica na vida adulta (3).

No Brasil, o beber precoce e regular também está acontecendo entre os jovens, de tal forma que a primeira vez de uso tem ocorrido aos 13,9 anos; enquanto o consumo regular é realizado aos 14,6 anos. Ao intensificar a problemática desta situação, 16% dos adolescentes brasileiros engajam-se em episódios de beber pesado episódico ou binge drinking, um comportamento de beber intenso em um curto espaço de tempo que predispõe o indivíduo a uma série de problemas sociais e de saúde (4).

Nesse sentido, entre a população jovem, os estudantes universitários têm merecido especial atenção, isso porque a entrada na universidade muitas vezes inaugura um período de maior autonomia, o que possibilita novas experiências e também por se constituir em um momento de maior vulnerabilidade, o que torna esta população mais susceptível ao uso de álcool e suas consequências (5-10).

O consumo de álcool entre os estudantes universitários tem se tornado, portanto, uma preocupação crescente nos últimos anos. Em um período caracterizado por muitas transições, os universitários estão mais vulneráveis ao início e manutenção do uso de álcool, substância da qual eles subestimam os efeitos negativos e, assim, ao consumi-la em altas doses e frequência, se expõem mais a situações de risco e prejuízos à saúde (5, 11).

Vale destacar que o consumo de álcool entre estudantes universitários é mais frequente e intenso que na população em geral, o que reforça a necessidade de um maior conhecimento desse fenômeno para o desenvolvimento de ações de prevenção e elaboração de políticas específicas dirigidas para esse segmento (5, 12). Além disso, a determinação da prevalência de uso e de opiniões sobre álcool entre os universitários é fonte potencial de informações sobre o comportamento e compreensão dessa população (5, 8-11, 13).

Portanto, o objetivo deste estudo foi identificar o consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes de enfermagem de uma universidade privada na cidade do Rio de Janeiro, Brasil.


Material e método

Trata-se de estudo epidemiológico descritivo do tipo transversal desenvolvido em uma universidade privada da cidade do Rio de Janeiro, Brasil. No mês de maio de 2008, quando da coleta de dados, a universidade em questão tinha 998 estudantes de enfermagem regularmente matriculados.

Em um único dia, estudantes dos três turnos do curso de enfermagem (matutino, vespertino e noturno) foram abordados em todas as salas de aula em uso, após autorização da coordenação do curso e do professor em sala. Ali foram prestadas informações sobre a natureza e os objetivos do estudo e, voluntariamente, 161 estudantes de ambos os sexos e de idade > 18 anos aceitaram participar dele, ao assinar o termo de consentimento livre e esclarecido, compondo, assim, sua amostra de conveniência.

Em seguida, os estudantes responderam individualmente a um questionário fechado, autoaplicável e anônimo que continha informações sociodemográficas (sexo, idade, exercício de atividade remunerada, renda familiar mensal e religião), perguntas selecionadas do Alcohol Use Disorders Identification Test - instrumento desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde que permite uma melhor compreensão do consumo de álcool entre estudantes universitários (9) - e outras sobre aspectos relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas (idade de experimentação, companhia na experimentação, tipo de bebida mais consumida, local habitual de consumo, problemas decorrentes do consumo, influência do ingresso na universidade sobre a frequência de consumo).

Na fase analítica dos dados, a revisão e codificação das questões foram realizadas e, em seguida, as informações contidas nos instrumentos de coleta dos dados foram digitadas no programa Excel (Windows XP/2000), no qual também foram realizadas as análises univariadas com distribuição de frequências simples para a descrição dos dados.

Os procedimentos éticos deste estudo são representados pela assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido pelos estudantes que aceitaram participar dele e pelo atendimento aos preceitos éticos constantes da Declaração de Helsinki (2008), pelos quais os princípios básicos da pesquisa com seres humanos (beneficência, respeito à pessoa e justiça) foram completamente atendidos, buscando salvaguardar o bem-estar, os direitos e a dignidade dos sujeitos.


Resultados

A amostra foi constituída em sua maioria por estudantes do 1° ano do curso de enfermagem (37,3%), do sexo feminino (84,5%), na faixa etária de 20-24 anos de idade (40,9%), de religião evangélica (34,8%), que não exerciam atividade remunerada (55,3%) e possuíam renda familiar mensal entre R$ 1530 e R$ 2550 (35%).

Entre os estudantes da amostra, 32,3% afirmaram nunca consumir bebidas alcoólicas e 10,6% afirmaram consumi-las de duas a três vezes por semana (Tabela 1).

A bebida referida como a mais consumida pelos estudantes foi a cerveja/chope (33,1%), seguida de perto pelo vinho (28,4%). Habitualmente eles afirmaram consumir bebidas alcoólicas em festas (50,4%), sendo que 32,1% deles afirmaram ingerir > 5 doses-padrão de álcool em um dia típico de consumo (Tabela 2).

Afirmaram experimentar bebidas alcoólicas antes dos 18 anos de idade 83,5% dos estudantes, sendo que 39,5% as experimentaram entre 14 e 15 anos; nesta experimentação, 17,4% deles afirmaram estar acompanhados dos pais. 22,1% dos estudantes afirmaram que o ingresso na universidade influenciou o aumento da frequência de consumo de bebidas alcoólicas e 19,3% deles afirmaram ter sofrido algum problema decorrente de seu consumo (Tabela 3).


Discussão

No que tange ao consumo de bebidas alcoólicas, alta proporção (67,7%) dos estudantes de enfermagem entrevistados referiu ser consumidora, sendo que 32,1% deles fazem consumo no padrão binge (> 5 doses-padrão de álcool em única ocasião), o que corrobora o amplamente descrito pela literatura a respeito dos estudantes de enfermagem (9-10, 14-15), bem como sobre estudantes universitários em geral (5, 8, 12-13).

Vale ressaltar que, para que problemas com o consumo de bebidas alcoólicas sejam evitados, homens saudáveis podem consumir não mais que três doses-padrão/dia e mulheres saudáveis não mais que duas doses-padrão/dia (1). Como neste estudo 45,9% dos entrevistados afirmaram consumir pelo menos três doses-padrão de álcool em dia típico de consumo, eles já estariam, portanto, expostos ao risco de desenvolvimento de problemas relacionados ao consumo dessa substância.

Conforme resultados do I Levantamento Nacional sobre o Uso de álcool, Tabaco e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras (5), no que diz respeito às consequências agudas, o fato de um em cada quatro universitários relatar consumo do álcool no padrão binge nos 30 dias anteriores à entrevista mostra que essa população está frequentemente exposta a riscos, especialmente acidentes de trânsito, intoxicação, a atos de violência e abuso sexual sob influência do álcool, sexo desprotegido, problemas acadêmicos (aprendizado e comportamentos inadequados e diminuição de produtividade) e problemas legais (3-4, 5, 7, 12).

Entre estudantes universitários de ciências da saúde de uma instituição privada brasileira, participantes de um estudo (16) que teve por objetivo entender os padrões de policonsumo simultâneo de drogas (PCSD) e suas implicações de gênero, sociais e legais, o PCSD foi realizado por 27,9% dos estudantes, sendo predominante a combinação de bebidas alcoólicas a outras drogas para lidar com situações sociais, facilitar a realização de atividades pouco prazerosas e perder as inibições naturais da idade. A combinação e o conjunto dessas razões de PCSD entre estudantes universitários, além de preocupantes, apontam para a necessidade de medidas que sirvam de suporte para lidar com os estressores cotidianos, como também despertar sensações que tragam bem estar geral (16).

Logo, é necessário o acompanhamento sistemático da evolução dos padrões de consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes universitários, uma vez que, na medida em que se mantém a disponibilidade dessa substância e dependendo da frequência às festas na universidade, da pressão social para consumi-la e do estresse decorrente do cotidiano universitário, o hábito de beber tende a se modificar ao longo do tempo. Assim, os universitários que atualmente não consomem no padrão bingepodem passar a beber desse modo prejudicial, o que os levaria, a médio ou longo prazo, a desenvolverem consequências severas (15).

Especialistas recomendam, portanto, que programas educativos sejam desenvolvidos a fim de alertar essa população a respeito dos limites de consumo de baixo risco de álcool e dos problemas que podem ser causados pelo seu consumo excessivo, além de sugestões para, caso queiram continuar consumindo bebida alcoólica, que tal consumo seja feito com responsabilidade (9).

A cerveja/chope foi apontada como a bebida alcoólica mais consumida pelos estudantes consumidores de álcool entrevistados. Resultados semelhantes foram encontrados em outros estudos desenvolvidos com estudantes de enfermagem (10) e de outras carreiras universitárias (13-14). A população brasileira também consome mais cerveja/chope que outros tipos de bebida alcoólica, pois de todas as doses-padrão anuais consumidas por brasileiros adultos dos dois gêneros, de qualquer idade e região do país, em torno de 61% são de cerveja/chope (4).

O local habitual de consumo de bebidas alcoólicas apontado por pouco mais da metade dos estudantes consumidores da amostra foram as festas. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo também realizado com estudantes de enfermagem, no qual os autores afirmam que o álcool tornou-se algo presente na maioria das ocasiões sociais, e tornou-se, assim, difícil realizar festas e comemorações entre estudantes universitários sem a presença de bebidas alcoólicas (10). No entanto, vale destacar, que, quanto mais o estudante frequenta festas, maior é o risco para o consumo prejudicial de bebidas alcoólicas (9).

O clima social do ambiente universitário é festivo. É fácil verificar isso nos campus campi, ao se observar o elevado número de cartazes de propaganda de festas universitárias que, além da festa propriamente anunciada, conteúdos referentes ao consumo excessivo de álcool estão presentes neles, o que oportuniza sua aceitação e apologia, e contribui para a publicidade indireta. A tendência é a aceitação do consumo excessivo de álcool como certo e natural, promovendo assim dessensibilização quanto aos possíveis prejuízos advindos dele, o que favorece atitudes imprudentes quanto ao consumo dessa substância (7).

A respeito da idade de experimentação de bebidas alcoólicas dos estudantes consumidores, 83,5% deles fizeram experimentação com idade inferior a 18 anos. Estudo conduzido entre estudantes de enfermagem de uma universidade do oeste do Estado de Santa Catarina (Brasil) apontou que 56% deles fizeram consumo pela primeira vez entre os 7 e 17 anos e 4% com 6 anos de idade (10). A idade média de experimentação do álcool encontrada em estudo conduzido entre estudantes de enfermagem da Universidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul (Brasil), foi de 15 anos (14). Outro estudo realizado com estudantes de Direito de uma universidade da capital do Maranhão (Brasil) evidenciou que 42% dos consumidores tiveram o primeiro contato com bebida alcoólica na faixa etária dos 16 aos 20 anos e que, dentre os que iniciaram o consumo antes dos 14 anos de idade, 47% tornaramse dependentes, enquanto dentre os que o iniciaram após os 21 anos, apenas 9% tornaram-se dependentes (13).

Tal qual encontrada neste estudo, a idade de início para o consumo do álcool se dá antes dos 16 anos de idade em mais de 50% dos estudantes universitários brasileiros. A precocidade para o consumo de álcool é preocupante visto que expõe essa população aos prejuízos agudos e crônicos decorrentes dessa substância de forma notável (5). Ademais, quanto mais precoce o consumo de álcool, maiores as chances de desenvolver dependência alcoólica, especialmente pela interferência sobre a etapa da vida em que acontece o processo de maturação do sistema nervoso central e da personalidade (3, 17).

Quanto à companhia na experimentação, 65,2% dos estudantes consumidores afirmaram estar acompanhados de amigos e 17,4% afirmaram acompanhados dos pais. Estudo apontou amigos e familiares como os responsáveis pela introdução no consumo de bebidas alcoólicas em estudantes de enfermagem, numa proporção de 49,2% e 20%, respectivamente (14). Outro estudo também realizado entre estudantes de enfermagem apontou que 65% dos consumidores responderam que foi na família o primeiro contato com bebidas alcoólicas (10).

A sociedade brasileira, de certa forma, incentiva o consumo de bebidas alcoólicas pelo fato de ela ser encarada de forma diferente, quando comparada às outras drogas. Além disso, família e sociedade aceitam com certa naturalidade um jovem consumir bebidas alcoólicas, podendo ocorrer alguma censura, se houver abuso, mas seu uso na família é bem tolerado com o primeiro contato geralmente acontecendo neste contexto, passando a fazer parte de todas as comemorações e confraternizações (10).

Afirmaram ter experimentado problemas decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas 19,3% dos consumidores de nossa amostra. Problemas recentes na vida relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes universitários da área da saúde, tais como culpa/remorso depois de beber, apagamentos (blackouts) e recebimentos de críticas por suas bebedeiras foram constatados em 35,7%, 37% e 42,4% dos consumidores, respectivamente, em estudo realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil) (8).

Análise detalhada da amostra de estudantes de enfermagem da Universidade de Passo Fundo (Brasil) - consumidores de bebidas alcoólicas - revelou que 69,7% deles relataram chegar à embriaguez, sendo que essa situação ocorreu para 31,8% no mês anterior à entrevista, e, após ter bebido, 21% admitem ter faltado à escola; 16,5%, ter dirigido e 2,3%, sofrido acidentes ou ter faltado ao trabalho (14).

Estudo realizado com estudantes de enfermagem da Universidade Nacional da Colômbia, Sede Bogotá (Colômbia), que viveram uma gravidez precoce buscou relacionar esta gravidez com o consumo de bebida alcoólica. Metade das estudantes entrevistadas relatou a influência do consumo dessa substância sobre a relação sexual que gerou a gravidez não planejada, o que estabelece uma possível relação entre o consumo de álcool e os comportamentos sexuais de risco (18).

Apesar de a maioria dos estudantes da nossa amostra (77,9%) negar a influência do ingresso na universidade no aumento da frequência de consumo de bebidas alcoólicas, sabe-se que, em geral, o ingresso na universidade ocorre em um momento difícil de mudanças e adaptações ao novo ambiente, momento esse em que a necessidade de aceitação e pertencimento grupal pode levar a mudanças de atitudes não adequadas (7), como o consumo excessivo de bebidas alcoólicas. Muitas vezes o acesso à universidade é encarado como um passaporte para a libertação individual do jugo familiar e, em busca de integração grupal e de novas experiências, os estudantes universitários podem expor-se à experimentação de drogas lícitas e ilícitas (14).

Adolescentes e adultos jovens constituem a população de maior risco para o consumo de bebidas alcoólicas, e a legitimação cultural ao consumo conferida por várias sociedades (14), inclusive a brasileira, contribui para essa situação. O álcool como bebida é de baixo custo e fácil obtenção no Brasil e, independentemente da quantidade consumida, é a substância psicoativa mais consumida pelo homem (13). As bebidas alcoólicas são facilmente encontradas por preços acessíveis, o que facilita ainda mais para os estudantes o seu consumo. A necessidade de se socializar e pertencer ao grupo pode fazer com que o consumo de álcool aumente, e, assim, os estudantes não percebam que, aos poucos, estão ingerindo álcool excessivamente (10).

Particularmente entre estudantes universitários, as festas com disponibilização de bebidas do tipo open barfacilitam o consumo excessivo (7, 9). Por isso, há necessidade de políticas que controlem a venda de bebidas alcoólicas para a população de jovens universitários, que regulamentem a promoção de festas com open bar, a venda de bebidas baratas em eventos universitários, assim como a venda de bebidas nos campi. Essas políticas também devem incentivar atividades e eventos voltados para esta população nos quais a bebida alcoólica não esteja incluída (9).

Em síntese, os resultados apontaram que o consumo de bebidas alcoólicas pelos estudantes de enfermagem da universidade em que este estudo foi desenvolvido não difere dos encontrados em outros grupos de estudantes universitários. No entanto, acreditamos que o presente estudo poderá somar-se aos já realizados e viabilizar comparações, além de contribuir para o conhecimento da magnitude do consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes universitários, especialmente entre aqueles da área de saúde, futuros profissionais que, inevitavelmente, atuarão como educadores e motivadores para a adoção de condutas saudáveis pela população em geral e deverão cuidar de pessoas acometidas por doenças/agravos advindos do consumo de bebidas alcoólicas.

Apesar de estes resultados não poderem ser extrapolados para populações clínicas ou participantes com menor nível educacional, eles apresentam importante contribuição para o entendimento do consumo de bebidas alcoólicas entre estudantes de enfermagem no contexto sociocultural brasileiro, além de apontarem a necessidade de políticas e programas de prevenção ao consumo excessivo de álcool voltadas para essa população.

Apontamos como limitações deste estudo a aplicação do instrumento somente em alunos que estavam presentes em sala de aula, e assim não obter informações sobre consumo de bebidas alcoólicas dos que não estavam; ter sido desenvolvido com amostra não probabilística, o que não permite fazer generalizações para a população de estudantes de enfermagem da universidade em que foi desenvolvido; a possibilidade do viés de memória e; a coleta de dados ter sido realizada em apenas um dia.



Referências

1. World Health Organization. Global status report on alcohol and health. Geneva: World Health Organization; 2011.

2. Schulte MT, Ramo D, Brown SA. Gender diferences in factors inluencing alcohol use and drinking progression among adolescents. Clin Psychol Rev. 2009; 29 (6): 535-47.

3. Hingson RW, Zha W. Age of drinking onset, alcohol use disorders, frequent heavy drinking, and unintentionally injuring oneself and others after drinking. Pediatrics 2009; 123 (6): 1477-84.

4. Laranjeira R, Pinsky I, Zaleski M, Caetano R (org.). I Levantamento nacional sobre os padrões de consumo de álcool na população brasileira. Brasília: Senad; 2007.

5. Andrade AG, Duarte PCAV, Oliveira LG (org.). I Levantamento nacional sobre o uso de álcool, tabaco e outras drogas entre universitários das 27 capitais brasileiras. Brasília: Senad; 2010.

6. Franca C, Colares V. Validação do National College Health Risk Behavior Survey para utilização com universitários brasileiros. Cien Saúde Colet. 2010; 15 (Supl. 1): 1209-15.

7. Musse AB. Apologia ao uso e abuso de álcool entre universitários: uma análise de cartazes de propaganda de festas universitárias. SMAD, Rev Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. Port) [on-line]. 2008 jan-jun. [Visitado nov. 2012]. 4(1):10p. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/smad/v4n1/v4n1a07.pdf

8. Peuker AC, Fogaça J, Bizarro L. Expectativas e beber problemático entre universitários. Psicologia: Teoria e Pesquisa 2006; 22 (2): 193-200.

9. Pillon SC, Corradi-Webster CM. Teste de identificação de problemas relacionados ao uso de álcool entre estudantes universitários. Rev enferm UERJ 2006; 14 (3): 325-32.

10. Stamm M, Bressan L. Consumo de álcool entre estudantes do curso de enfermagem de um município do oeste catarinense. Cienc Cuid Saúde 2007; 6 (3): 319-24.

11. National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism. A Call to Action: Changing the culture of drinking at US colleges. NIAAA; 2005.

12. Wagner GA, Andrade AG. Uso de álcool, tabaco e outras drogas entre estudantes universitários brasileiros. Rev Psiq Clín. 2008; 35 (Supl. 1): 48-54.

13. Carvalho DA, Gomes RIB, Sousa VEC, Sardinha AHL, Costa Filho MR. Hábitos alcoólicos entre universitários de uma instituição pública. Cienc Cuid Saúde 2011; 10 (3): 571-7.

14. Picolotto E, Libardoni LFC, Migott AMB, Geib LTC. Prevalência e fatores associados com o consumo de substâncias psicoativas por acadêmicos de enfermagem da Universidade de Passo Fundo. Cien Saúde Colet. 2010; 15 (3): 645-54.

15. Pillon SC, Santos MA, Gonçalves AMS, Araujo KM. Uso de álcool e espiritualidade entre estudantes de enfermagem. Rev Esc Enferm USP 2011; 45 (1): 100-7

16. Nóbrega MPSS, Simich L, Strike C, Brands B, Giesbrecht N, Khenti A. Policonsumo simultâneo de drogas entre estudantes de graduação da área de ciências da saúde de uma universidade: implicações de gênero, sociais e legais, Santo André - Brasil. Texto Contexto Enferm. 2012; 21 (Spe): 25-33.

17. Zucker RA. Anticipating problem alcohol use developmentally from childhood into middle adulthood: what have we learned? Addiction. 2008; 103 (Supl.1): 100-8.

18. Alvarez ML. Gravidez precoce de estudantes de enfermagem e o consumo de álcool. Rev Latino-Am Enfermagem 2008; 16 (Spe): 577-83.

Inicio