Artigo
Lucelia Terra Chini1
Roberta Aparecida Mendes2
Lais Reis Siqueira3
Sandreli Pereira da Silva4
Patrícia Costa dos Santos Silva5
Eliza Maria Rezende Dázio6
Silvana Maria Coelho Leite Fava7
1 orcid.org/0000-0003-0266-5295. Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. lucelia.jonas@unifal-mg.edu.br
2 orcid.org/0000-0001-9209-1306. Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. robertaaparecidamendes@hotmail.com
3 orcid.org/0000-0002-6720-7642. Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. laisreis.siqueira@gmail.com
4 orcid.org/0000-0003-1717-7729 . Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. sandrelipereira@hotmail.com
5 orcid.org/0000-0001-9643-1865. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Brasil. patriciacostaunifenas@hotmail.com
6 orcid.org/0000-0001-9216-6283. Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. eliza.dazio@unifal-mg.edu.br
7 orcid.org/0000-0003-3186-9596. Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas/UNIFAL, Brasil. silvana.fava@unifal-mg.edu.br
Recibido: 26 de junio de 2015
Enviado a pares: 27 de julio de 2015
Aceptado por pares: 18 de mayo de 2016
Aprobado: 31 de mayo de 2016
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Chini LR, et. al. O uso do Aloe sp (babosa) em feridas agudas e crônicas: revisão integrativa. Aquichan. 2017; 17(1): 7-17. Doi: 10.5294/aqui.2017.17.1.2
RESUMO Objetivos: buscar evidências disponíveis na literatura sobre o uso de Aloe vera na cicatrização de feridas agudas e crônicas. Materiais e método: trata-se de uma revisão integrativa realizada nas bases de dados LILACS, PubMed e Scopus, no período de fevereiro a março de 2015. A busca resultou em 178 publicações. Resultados: sete estudos constituíram a revisão, os quais envolveram pessoas com feridas cirúrgicas de cesariana, feridas de episiotomia, queimaduras, área doadora de enxerto, feridas pós-hemorroidectomia e feridas fissuras anais crônicas. Evidenciou-se que Aloe vera promove a cicatrização de feridas, além de diminuir a dor em fissuras anais crônicas e queimaduras. Conclusões: Aloe vera representa uma nova terapêutica no tratamento de feridas, no entanto as evidências disponíveis sobre sua eficácia e segurança são insuficientes para legitimar o seu uso na cicatrização de feridas agudas e crônicas; portanto, não podem ser generalizadas. PALAVRAS-CHAVE : Aloe; cicatrização de feridas; ferimento e lesões; fitoterapia; plantas medicinais (Fonte: DeCS, BIREME). |
RESUMEN Objetivos: buscar evidencias disponibles en la literatura acerca del uso de Aloe sp (sábila) en la cicatrización de heridas agudas y crónicas. Materiales y método: se trata de una revisión integradora realizada en las bases de datos LILACS, PubMed y Scopus, en el periodo de febrero a marzo del 2015. La búsqueda resultó en 178 publicaciones. Resultados: siete estudios constituyeron la revisión, los cuales involucraron personas con heridas de cesárea, heridas de episiotomía, quemaduras, área donadora de injerto, heridas posthemorroidectomía y heridas fisuarias anales crónicas. Se evidenció que la sábila promueve la cicatrización de heridas, además de disminuir el dolor en fisuras anales crónicas y quemaduras. Conclusiones: la sábila representa una nueva terapéutica en el tratamiento de heridas; sin embargo, las evidencias disponibles sobre su eficacia y seguridad son ineficientes para legitimar su uso en la cicatrización de heridas agudas y crónicas; por lo tanto, no se pueden generalizar. PALABRAS CLAVE : Aloe; cicatrización de heridas; heridas y lesiones; fitoterapia; plantas medicinales (Fuente: DeCS, BIREME). |
ABSTRACT Objective: Search for available evidence in literature on the use of aloe vera in healing acute and chronic wounds. Method: This is an integrative review of the Lilacs, Pubmed and Scopus databases from February to March 2015. The search turned up 178 publications. Results: Seven studies were included in the review, which involved persons with surgical wounds from caesarean sections, episiotomy wounds, burns, graft donor areas, post-hemorrhoidectomy wounds and chronic anal fissure wounds. It has been shown that aloe vera helps wound healing, in addition to reducing pain in chronic anal fissures and burns. Conclusion: Aloe vera represents a new therapy in the treatment of wounds. However, the available evidence on its effectiveness and safety is insufficient to legitimize the use of aloe in healing acute and chronic wounds. Therefore, the findings cannot be generalized. KEYWORDS: Aloe; wound healing; wounds and lesions; phytotherapy; medicinal plants (Source: DeCS, BIREME). |
Introdução
Feridas constituem um problema de saúde pública, sendo a cicatrização de tecidos o principal objetivo da intervenção clínica (1). Feridas podem resultar de muitas doenças e podem ser classificadas como aguda ou crônica conforme tempo de existência (2). Ferida aguda segue um processo de reparação previsível e persiste até 14 dias após intervenção cirúrgica ou trauma. Já ferida crônica pode ser definida como aquela que necessita de terapêutica após seis semanas do seu surgimento (3).
Embora haja uma gama de substâncias sintéticas para tratamentos de feridas, o consumo de práticas terapêuticas à base de ervas medicinais tem se destacado nos últimos anos no contexto da saúde, possivelmente associado à percepção de que o consumo de produtos naturais é sinônimo de bem-estar e qualidade de vida (4). Sendo assim, estudos envolvendo fitoterápicos que atuam no processo de cicatrização estão sendo desenvolvidos e, entre eles, encontram-se estudos com uso de Aloe vera, o qual tem sido reincorporado como alternativa ou complemento terapêutico.
Por sua vez, Aloe vera,também conhecida como babosa, tem sido utilizada há muito tempo no tratamento de várias condições de saúde, como neoplasia, conjuntivite, hiperglicemia, dislipidemia e na cicatrização de feridas (5). Devido ao seu poder emoliente e suavizante é muito utilizada nas lesões de pele. Além disso, apresenta efeito anti-inflamatório, antioxidante, cicatrizante, bactericida e laxativo. Aloe vera contém cerca de 70 componentes potencialmente ativos, dentre eles vitaminas, enzimas, minerais, açúcares, além de ácido salicílico e ácidos aminados (2, 6).
A divulgação dos potencias benefícios do Aloe vera tem despertado crescente interesse na população. No entanto, um dos principais problemas no uso de fitoterápicos está relacionado à falta de evidências pautadas em estudos padronizados sobre sua eficácia e segurança bem como sobre a composição desses produtos (4, 6).
Face ao exposto e considerando a importância de sintetizar o conhecimento acerca de novos biomateriais que podem acelerar o processo de cicatrização, decidiu-se pela elaboração deste estudo, o qual objetivou buscar evidências na literatura científica a respeito do uso de Aloe vera na cicatrização de feridas agudas e crônicas.
Método
Trata-se de uma revisão integrativa, na qual foram percorridas as seguintes etapas: identificação do tema e seleção da questão de pesquisa; estabelecimento de critérios para inclusão e exclusão de estudos; avaliação dos artigos incluídos na revisão; síntese do conhecimento dos principais resultados evidenciados na análise dos artigos incluídos e apresentação da revisão (7).
Para nortear o estudo, formulou-se a seguinte questão norteadora: "quais evidências científicas acerca da aplicação tópica de Aloe sp(babosa) na cicatrização de feridas agudas e crônicas em humanos?". Empregou-se a estratégia PICO, na qual P referese à população do estudo, ou seja, as pessoas com feridas agudas ou crônicas; I refere-se à intervenção estudada, isto é, aplicação tópica de Aloe veranas feridas; C refere-se ao grupo controle ou à comparação com outra intervenção já conhecida; e O refere-se ao resultado buscado com a intervenção em estudo, que neste estudo consiste na cicatrização da ferida.
Para a seleção dos estudos, utilizaram-se bases de dados consideradas importantes no contexto da saúde e disponíveis on-line: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), National Library of Medicine National Institute of Health (Pubmed) e Scopus.
Os critérios de inclusão estabelecidos para a seleção dos artigos foram: artigos primários publicados na íntegra que abordassem a aplicação de Aloe vera em humanos com feridas agudas e crônicas, nos idiomas em português, inglês e espanhol. A revisão da literatura restringiu-se às publicações da última década (entre 2005 a 2015). Os critérios utilizados para exclusão dos artigos foram: artigos do tipo revisão de literatura, cartas, editoriais, relatos de experiência, estudos de casos, dissertações e teses. Além disso, foram excluídos estudos primários que abordavam a aplicação de Aloe veraem animais, em testes in vitroe em lesões orais.
O levantamento dos estudos foi realizado em fevereiro e março de 2015, ao mesmo tempo nas três bases, utilizando os seguintes unitermos: Aloe e cicatrização de feridas (wound healing). Realizou-se uma avaliação dos artigos por dois revisores, sendo posteriormente comparados os resultados, no intuito de certificar que os mesmos atendiam aos critérios de inclusão.
As informações foram extraídas dos artigos por meio de um instrumento construído pelos autores, o qual foi submetido a um processo de refinamento com finalidade de analisar os itens quanto à aparência, pertinência e relevância. Tal instrumento contempla os seguintes itens: identificação do autor, do título, do ano de publicação e da instituição, objetivo do estudo, características do método, nome científico da Aloe vera, forma de preparação do produto (gel, creme, pomada), custo do tratamento, efeitos adversos, resultados e conclusões obtidas e, por fim, classificação da evidência quanto ao nível e quanto à força de recomendação.
A apresentação da revisão foi realizada de forma descritiva a fim de oferecer elementos de cada estudo para permitir ao leitor o entendimento do mesmo e a avaliação crítica dos resultados obtidos no sentido de oferecer subsídios a sua aplicabilidade na prática clínica e identificação de lacunas do conhecimento para desenvolvimento de futuras investigações.
Para análise da qualidade de evidência dos estudos (8), adotou-se a seguinte classificação: nível I —evidência proveniente de resultados de revisões sistemáticas ou meta-análise de ensaios clínicos randomizados controlados (ECRC) relevantes, ou de diretrizes clínicas, fundamentadas em revisões sistemáticas de ECRC; nível II —evidência obtida de ECRC bem delineado; nível III —evidência obtida de ensaios clínicos bem delineados, sem randomização; nível IV —evidência proveniente de estudo caso controle ou coorte; nível V —evidência proveniente de revisão sistemática de estudos qualitativos e descritivos; nível VI —evidência derivada de estudo descritivo ou qualitativo; nível VII — evidência oriunda da opinião de autoridades e/ou relatórios de comitês de especialistas. Com relação à classificação quanto à força de evidência, os níveis I e II são considerados evidências fortes, III e IV moderadas e V a VII fracas.
Quanto aos aspectos éticos, as informações específicas extraídas dos artigos foram acessadas por meio de bancos de dados, não necessitando de autorização para utilizá-las por se tratarem de material pertencente ao domínio público.
Resultados e discussão
Identificaram-se setes estudos na base de dados Lilacs, 91 na Pubmed e 80 na Scopus, totalizando 178 publicações. Seguindo os critérios de seleção, apenas 23 artigos envolviam seres humanos, dos quais 16 foram eliminados e, dessa forma, sete artigos foram incluídos na revisão integrativa. Os detalhes dos passos percorridos para seleção dos artigos estão descritos na (figura 1)
Figura 1. Processo de seleção de artigos da revisão integrativa — Adaptação do Flow Diagram (9).
Fonte: adaptação do Flow Diagram (9).
Com relação à caracterização dos estudos, seis foram desenvolvidos no Irã e apenas um no Paquistão. Quanto ao idioma, todos os artigos foram publicados em inglês. Já com relação à instituição de origem dos autores, todos estão vinculados às universidades.
Circundando a questão referente ao país de desenvolvimento do estudo, observa-se que todos foram desenvolvidos no continente asiático, tendo em vista que uso de Aloe vera com finalidade terapêutica de cicatrização de lesão é permitido nesses países. Em contrapartida, nos Estados Unidos, o gel de Aloe é aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA) como um aromatizante natural e pequenas quantidades podem ser utilizadas em alimentos. Em 1999, o FDA determinou que medicamentos orais e injetáveis contendo Aloe não podem ser vendidos para tratamento de doenças, entre elas câncer, herpes, moléstias autoimunes e constipação, tendo em vista que não há conhecimentos suficientes sobre a sua segurança e eficácia (10).
No Brasil, produtos de uso tópico contendo Aloe vera estão autorizados como fitoterápicos para fins de cicatrização (4). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) proibiu a comercialização de sucos e outros alimentos à base de Aloe vera devido ao relato de reações adversas (4) e visto que as evidências científicas são insuficientes para comprovar sua segurança (2, 6). Além disso, não há estudos sistemáticos sobre a toxicologia do Aloe, considerando que estes são necessários para investigação de possíveis danos ao organismo. Ademais, não existe uma fórmula padrão para preparação dos produtos contendo Aloe vera(4).
Quanto ao nível de evidência dos estudos (8), seis estudos foram classificados como nível II e apenas um como nível III pelo fato de ser ensaio clínico sem randomização. Dessa forma, seis estudos apresentam força de evidência forte e um apresenta força de evidência moderada. A identificação do nível de evidência oferece subsídios para uma avaliação crítica dos resultados de pesquisa e, por conseguinte, para subsidiar a tomada de melhores decisões clínicas.
Com relação à família da babosa, todos os artigos citaram como pertencente à família das Liliáceas e do gênero Aloe, conforme Tabela 1. Entre as espécies das Liliáceas existentes, as mais conhecidas são: Aloe socotrina, Aloe arborescens, Aloe chinensis, Aloe ferox e Aloe vera, sendo essa última também conhecida como Aloe barbadenses. Esta é a mais estudada pelas indústrias alimentícias, farmacêuticas, cosméticas e fitoterápicas (11). Trata-se de uma planta herbácea, que necessita de luz solar direta, não exige muita água e se desenvolve melhor em solos leves e arenosos. Popularmente é conhecida como babosa, Aloe, Aloe-de-barbados e Aloe-de-curaçao (12).
Os estudos incluídos na presente revisão utilizaram várias formulações tópicas de Aloe vera. Observou-se que houve predominância do creme de Aloe a 0,5% (57%). Apenas um estudo (14,2%) referiu a utilização de gel fresco natural e um (14,25%) referiu a aplicação de gel de Aloe, composto de 98% do gel bruto do interior da folha da planta. Por fim, um estudo (14,25%) não revelou a forma de preparação do produto, como pode ser observado na (Tabela 1).
Tabela 1. Características dos estudos com relação ao nome científico da Aloe, forma de preparação e tipo de lesão.
Fonte: elaboração própria.
Conforme apresentado na Tabela 1), no estudo 01, o gel fresco in natura foi usado a fim de preservar suas substâncias eficazes, tendo em vista que algumas destas substâncias são desperdiçadas no processo de preparação e conservação (20). Este gel com aparência viscosa e incolor pode ser obtido a partir da eliminação dos tecidos mais externos da folha, e é constituído por água, polissacarídeos e outras substâncias como vitamina A, B, C e E, cálcio, potássio, magnésio, zinco, aminoácidos, enzimas e carboidratos (5).
Já nos estudos 04, 05, 06 e 07, o creme era composto de suco do interior da planta, além de parafina líquida e sólida, álcool estearílico, álcool cetílico, propileno, água desionizada, laurilsulfato de sódio e metil-parabeno. Ademais, o Conselho Internacional de Ciência de Aloe (IASC), uma organização norte-americana sem fins lucrativos, determina que apenas produtos que contenham acemano ou o beta 1-4 glucomanonas acetilados, podem ser considerados como Aloe vera(21). Por sua vez, acemano é um polissárideo que tem sido apontando como responsável pela proliferação de fibroblastos (5,6) e assim, promove a deposição de colágeno e reorganiza o tecido lesionado.
Com relação ao custo do tratamento, apenas um estudo referiu que o custo do tratamento com Aloe veraé menor do que o tratamento do grupo controle, que neste caso foi a sulfadiazina de prata (15). Já com relação aos efeitos adversos, cinco estudos (13,15,17-19) informaram que os pacientes não apresentaram quaisquer complicações e reações alérgicas em decorrência da aplicação da cobertura de Aloe vera.
Feridas agudas e crônicas
Com relação ao tipo de ferida, seis estudos envolveram pessoas com feridas agudas; entre elas, feridas cirúrgicas de cesariana (13), feridas de episiotomia (14), queimaduras (15-16), área doadora de enxerto (17) e feridas pós-hemorroidectomia (18). Apenas um estudo selecionou pessoas com feridas crônicas: fissuras anais crônicas (19).
Conforme o quadro 2, o estudo 01 foi conduzido com 90 mulheres divididas em dois grupos com a finalidade de determinar a eficácia do gel de Aloe vera na cicatrização de feridas cirúrgicas de cesariana (13). No grupo de intervenção o gel de Aloe foi aplicado diretamente sobre a ferida suturada e coberto com gaze seca. Já no grupo controle, a ferida cirúrgica foi coberta somente com gaze seca. A cicatrização da ferida foi avaliada 24 horas e oito dias após a cesariana pelo pesquisador por meio da escala Reeda (vermelhidão, edema, equimose, secreção e cicatrização). A pontuação total da escala varia de 0 a 15, quanto mais próximo de 15, menor o grau de cicatrização da ferida.
O estudo 02 recrutou 111 mulheres primíparas submetidas à episiotomia, as quais foram distribuídas aleatoriamente em três grupos: grupo de Aloe vera, grupo de pomada de calêndula e grupo controle (14). A intervenção foi realizada quatro horas após a episiotomia, e a primípara continuou usando o produto a cada 8 horas. O grupo controle recebeu a rotina do hospital (betadine em quatro copos de água a cada quatro horas). A avaliação da cicatrização da episiotomia foi feita cinco dias após a intervenção por meio da Escala Reeda.
No estudo 03, 50 pacientes com queimaduras de segundo grau foram randomizados em dois grupos: um recebeu tratamento com Aloe vera (25 pacientes) e outro recebeu sulfadiazina de prata —25 pacientes (15). O tratamento com agentes tópicos foi mantido duas vezes por dia até a completa reepitelização da ferida. Dor e irritação local foram registrados regularmente.
O estudo 04 também foi conduzido com pacientes queimados. Foram recrutados 30 pacientes com tipos similares de queimaduras de segundo grau em dois locais, em diferentes partes do corpo (16). De forma, aleatória, cada paciente teve uma queimadura tratada com sulfadiazina de prata tópica e uma tratada com creme de Aloe vera. O curativo foi aplicado duas vezes por dia.
Já o estudo 05 foi conduzido com 45 pessoas que se submeteram a coleta de enxerto de pele devido ao trauma ou tumor (17). Foram divididas em três grupos: grupo do creme de Aloe vera, do creme de placebo e grupo controle (gaze seca sem agente tópico). Todos os enxertos de pele foram colhidos a partir de regiões anterolateral e posterior da coxa. Os grupos de Aloe verae grupos de placebo receberam curativos três vezes por dia. A ferida foi avaliada no pós-operatório e até completa reepitelização.
O estudo 06 recrutou 49 pacientes que apresentam hemorroidas sintomáticas grau III ou IV e preencheram os critérios para cirurgia de hemorroidectomia (18). Os pacientes foram randomizados em dois grupos: 24 (Aloe) e 25 (placebo). Os pacientes aplicaram creme (Aloe ou placebo) imediatamente e 12 horas após a cirurgia. Este tratamento foi continuado no local da cirurgia três vezes por dia até 28° dia pós-operatório. A dor pós-operatória foi avaliada por meio de uma escala visual analógica, com classificação de 0 (sem dor) a 10 (dor muito grave). Escore de dor foi obtido imediatamente, 12 horas, 24 horas e 48 horas após a cirurgia e no 14° e 28° dia. As feridas foram classificadas como grau I (ferimento grave e fresco, com inflamação), grau II (tecido de granulação na ferida) e grau III (camada de células epiteliais que cobrem em ferida).
Por fim, o estudo 07 foi conduzido com 60 pacientes com fissuras anais crônicas. Foram divididos em dois grupos de 30 pacientes (19). O grupo controle recebeu placebo e o grupo de intervenção a aplicação tópica de creme de Aloe na ferida local três vezes ao dia, imediatamente após a instrução de um médico. O tratamento durou três semanas. Todos os pacientes foram acompanhados após a alta do hospital. O protocolo de tratamento para pacientes do grupo controle foi similar ao grupo de tratamento; no entanto, o grupo controle recebeu creme de placebo.
A (Tabela 2) apresenta a síntese dos principais resultados e das conclusões dos artigos incluídos na presente revisão.
Tabela 2. Síntese dos principais resultados e das conclusões dos artigos incluídos na presente revisão.
Fonte: elaboração própria.
A presente revisão descreveu a eficácia da Aloe vera sobre a cicatrização de feridas agudas e crônicas. Após busca na literatura, foram incluídos sete ensaios clínicos com tamanho amostral médio de 62 pacientes. Destes, cinco estudos evidenciaram que Aloe vera diminui o tempo de cicatrização da ferida quando comparados com o grupo controle, ou seja, grupo com gaze seca sem agente tópico (13), grupo com sulfadiazina de prata (15,16) e grupo com creme de placebo (18,19).
Com relação ao uso de Aloe vera na lesão por episiotomia (14), Aloe verae pomada de Calêndula promovem considerável cicatrização cinco dias pós-parto em comparação com Betadine. No entanto, há uma carência de estudos sobre o efeito de Aloe e calêndula na cicatrização de feridas de episiotomia, porém pesquisas semelhantes foram feitas relacionadas aos efeitos de outras ervas medicinais. Estudo realizado em um hospital coreano sobre os efeitos do extrato de lavanda na cicatrização de feridas de episiotomia revelou que a lavanda acelera a cicatrização da mesma (22).
No estudo sobre cicatrização da área doadora de enxerto (17), o creme de Aloe apresentou um tempo mais curto para a cicatrização de feridas com relação ao curativo de gaze, no entanto, seu efeito não foi melhor do que o creme de placebo. Uma vantagem desta investigação foi o uso de creme de placebo, além de creme de Aloe e curativo com gaze sem agente tópico, que forneceu dados confiáveis para determinar os efeitos benéficos do creme de Aloe vera em feridas na área doadora. Nos grupos tratados com cremes, estes foram aplicados de forma contínua nos locais doadores, os quais induziram um ambiente úmido em comparação com gaze seca. Uma provável explicação para este resultado pode estar relacionada ao fato de curativos úmidos diminuírem o tempo de cicatrização em comparação com curativos semiúmidos (18).
As evidências sobre a cicatrização de feridas à base de Aloe vera são contraditórias. Estudo realizado com pessoas com feridas infectadas e não cicatrizadas de cesariana e de cirurgia abdominal ginecológica, Aloe vera causou um atraso na cicatrização de feridas (23). Isto pode ser devido à diferença no método do estudo e do tipo de feridas dos pacientes, tendo em vista que usaram uma escala avaliação de cicatrização de feridas diferente do estudo incluído na revisão (13).
Uma das principais indicações de uso de gel de Aloe vera é para cicatrização de queimaduras, no entanto poucos estudos têm comparado a eficácia deste gel com sulfadiazina de prata no tratamento de queimaduras. Os dois estudos (15,16) envolvendo pacientes com queimaduras de segundo grau evidenciaram que a Aloe vera diminui o tempo de cicatrização quando comparada com sulfadiazina de prata.
Uma das principais limitações dos ensaios clínicos está relacionada ao fato dos pacientes do grupo de intervenção e controle possuírem fatores diferentes, os quais podem influenciar nos resultados. Dessa forma, os resultados do estudo conduzido por Khorasani et al. (16) são relevantes pelo fato de selecionar paciente com duas queimaduras de tamanho e tipo similar, ou seja, o paciente é controle dele mesmo, eliminando, assim, os diversos parâmetros que poderiam causar divergências nos resultados.
O estudo conduzido com pacientes submetidos à cirurgia de hemorroidectomia (18) demonstrou que creme de Aloe vera foi eficaz na cicatrização da lesão cirúrgica e no alívio da dor. Aloe vera aumenta a síntese de colágeno no tecido de granulação, bem como aumenta a proliferação de fibroblastos, que por sua vez proporciona resistência e integridade para a derme e outros tecidos (6). Os efeitos anti-inflamatórios da Aloe contribuem para alívio da dor pós-operatória. Além disso, Aloe tem efeito antimicrobiano, o qual está relacionado com os seus constituintes, incluindo antraquinonas e aloe-emodina. Este efeito antimicrobiano pode contribuir para a redução da dor e promoção da cicatrização de feridas. Em suma, o papel benéfico do Aloe vera se deve às suas propriedades anti-inflamatórias, antimicrobianas e de cicatrização de feridas (5,6).
O creme de Aloe também teve efeito positivo sobre lesões crônicas, especificamente sobre fissuras anais crônicas (19). Num estudo de caso envolvendo paciente com ferida isquêmica, no qual houve aplicação de Aloe verae colágeno, o produto mostrou-se eficaz na cicatrização de feridas (24).
Considerações finais
A presente investigação buscou mostrar evidências científicas sobre a utilização de Aloe vera na cicatrização de feridas agudas e crônicas. Os estudos disponíveis evidenciaram que produtos à base de Aloe vera aceleram o processo de cicatrização de feridas agudas e crônicas, quando comparados com placebo, sulfadiazina de prata e gaze sem agente tópico. Além disso, diminui a dor em fissuras anais crônicas e queimaduras.
Aloe vera representa uma nova terapêutica no tratamento de feridas, no entanto, as evidências disponíveis sobre sua eficácia e segurança são insuficientes para legitimar o uso de Aloe na cicatrização de feridas agudas e crônicas, nem tão pouco para generalizações. Isso se deve principalmente à carência de ensaios clínicos com métodos bem delineados. Além do mais, não há uma padronização da composição dos produtos à base de Aloe vera, da técnica de processamento e nem da sua forma de aplicação, considerando que essas questões são importantes para conservar suas características químicas e para maior efeito farmacológico esperado.
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