Artigo

Fatores associados ao diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente em pacientes em hemodiálise

Factores asociados al diagnóstico Riesgo de volumen deficiente de líquidos en pacientes en hemodiálisis

Factors Associated with a Diagnosis of Fluid Volume Deficit Risk in Patients on Hemodialysis

Érida Maria Diniz-Leite1
Isadora Costa-Andriola2
Maria Isabel da Conceição Dias-Fernandes3
Juliane Rangel-Dantas4
Jéssica Dantas de Sá Tinôco5
Ana Luisa Brandão de Carvalho Lira6

1 orcid.org/0000-0003-2452-7483. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. compclp@ufrn.edu.br

2 orcid.org/0000-0003-3446-675X. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. isacosta@ufrn.edu.br

3 orcid.org/0000-0003-0569-5027. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. mariaisabel@ufrn.edu.br

4 orcid.org/0000-0002-1542-1559. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. jessicads@ufrn.edu.br

5 orcid.org/0000-0002-1111-0390. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. julianerangel@ufrn.edu.br

6 orcid.org/0000-0002-7255-960X. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil. analira@ufrnet.br

Recibido: 01 de marzo de 2016
Enviado a pares: 22 de abril de 2016
Aceptado por pares: 22 de agosto de 2016
Aprobado: 06 de septiembre de 2016

10.5294/aqui.2017.17.2.3

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Diniz-Leite EM, Costa-Andriola I, Dias-Fernandes MIC, Rangel-Dantas J, Dantas de Sá Tinôco J, Brandão de Carvalho Lira AL.  Fatores associados ao diagnóstico risco de volume de líquidos deficiente em pacientes em hemodiálise. Aquichan. 2017;17(2):140-149. Doi: 10.5294/aqui.2017.17.2.3


RESUMO

Objetivo: verificar a associação entre as características socioeconômicas e clínicas e os fatores associados ao diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente em pacientes em hemodiálise.
Materiais e método: estudo transversal, realizado em uma unidade de diálise de um hospital universitário no nordeste do Brasil, com 50 pacientes, por meio de entrevista e exame físico. Para a análise dos dados, utilizou-se o teste de U Mann-Whitney.
Resultados: verificaram-se as seguintes associações significativas: deficiência de conhecimento e tempo de hemodiálise (p=0,037); extremos de peso e renda familiar (p=0,040); extremos de peso e volume de ultrafiltração (p=0,010), e perda de líquidos por vias anormais e volume de ultrafiltração (p=0,000).
Conclusões: foram identificadas associações entre os fatores associados do diagnóstico de enfermagem Risco de volume de líquidos deficiente e as características socioeconômicas e clínicas presentes nos pacientes submetidos ao tratamento hemodialítico. Assim, constatou-se que os fatores associados do diagnóstico em questão podem sofrer influências de características socioeconômicas e clínicas.

PALAVRAS-CHAVE: Diagnóstico de enfermagem; diálise renal; enfermagem; líquidos corporais; pesquisa em enfermagem clínica (Fonte: DeCS, BIREME).

RESUMEN

Objetivo: verificar la asociación entre las características socioeconómicas y clínicas, y los factores asociados al diagnóstico Riesgo de volumen deficiente de líquidos en pacientes en hemodiálisis.
Materiales y método: estudio transversal, realizado en una unidad de diálisis de una clínica universitaria en el noreste de Brasil, con 50 pacientes, por medio de entrevistas y examen físico. Para análisis de los datos se empleó la prueba U Mann-Whitney.
Resultados: se verificaron las siguientes asociaciones significativas: deficiencia de conocimiento y tiempo de hemodiálisis (p=0,037); extremos de peso y renta familiar (p=0,040); extremos de peso y volumen de ultrafiltración (p=0,010), y pérdida de líquidos por vías anormales y volumen de ultrafiltración (p=0,000).
Conclusiones: se identificaron asociaciones entre los factores asociados del diagnóstico de enfermería Riesgo de volumen deficiente de líquidos y las características socioeconómicas y clínicas presentes en los pacientes sometidos al tratamiento hemodialítico. Así, se encontró que los factores asociados de tal diagnóstico pueden sufrir influencias de características socioeconómicas y clínicas.

PALABRAS CLAVE: Diagnóstico de enfermería; diálisis renal; enfermería; investigación en enfermería clínica; líquidos corporales (Fuente: DeCS, BIREME).

ABSTRACT

Objective: Verify the association between socioeconomic and clinical characteristics and the factors associated with a diagnosis of fluid volume deficit Risk in patients who are on hemodialysis.
Materials and methods: This is a cross-sectional study done at the dialysis unit of a university hospital in northeastern Brazil. Featuring 50 patients, it was conducted through interviews and physical examinations. The Mann-Whitney U-test was used to analyze the data.
Results: A number of significant associations were verified; namely, knowledge deficit and hemodialysis time (p = 0.037); weight extremes and family income (p = 0.040); weight extremes and ultrafiltration volume (p = 0.010), and fluid loss through abnormal pathways and ultrafiltration volume (p = 0.000).
Conclusions: Associations were identified between the factors associated with a nursing diagnosis of fluid volume deficit Risk and the socioeconomic and clinical characteristics of patients who are undergoing hemodialysis. The factors associated with that diagnosis can be influenced by socioeconomic characteristics and clinical aspects.

KEYWORDS: Nursing diagnosis; renal dialysis; nursing; nursing research; body fluids (Source: DeCS, BIREME).



Introdução

No âmbito da prática profissional, hodiernamente, sabe-se que a utilização dos diagnósticos de enfermagem (DE) é imprescindível à escolha de intervenções capazes de produzir resultados desejados no tratamento de uma clientela, de modo que suas necessidades sejam atendidas. A partir da difusão dessa linguagem padronizada enseja-se o alcance de aspectos relevantes concernentes à segurança do paciente (1).

Nesse sentido, compreende-se que a utilização de taxonomias de enfermagem, cujo objetivo é categorizar cientificamente a linguagem, a exemplo dos diagnósticos de enfermagem, fundamenta a prática profissional baseada em evidência. O DE, no papel de segunda etapa do Processo de Enfermagem pode ser estabelecido com base no uso da Nanda Internacional, por se tratar de uma das mais utilizadas taxonomias em âmbito mundial (2).

Nesse contexto, o DE Risco de Volume de líquidos deficiente (RVLD), presente nessa taxonomia, pertencente ao domínio nutrição, classe hidratação, pode ser definido como “risco de diminuição do líquido intravascular, intersticial e/ou intracelular. Refere-se à desidratação, com perda de água apenas, sem mudança no sódio” (1). Esse diagnóstico revela-se significativo na conjuntura dos pacientes portadores de doença renal crônica (DRC) submetidos ao tratamento hemodialítico, provavelmente devido à retirada excessiva de líquido do volume plasmático durante a terapia (3,4).

Realidade comprovada por estudo que verificou a presença de desidratação em grande parte dos pacientes com DRC após o período de hemodiálise (3). Corroborando com esses dados, outro estudo realizado com 47 pacientes com doença renal crônica em hemodiálise mostrou a presença da desidratação em 52,2% dos pacientes no período pós-diálise (4).

Nesse contexto, a doença renal crônica, afecção na qual se observa uma deterioração lenta e progressiva da função renal, cuja classificação poderá se subdividir em cinco estágios distintos conforme a variação da taxa de filtração glomerular (TFG) verifica-se no quinto e último estágio, uma TFG incompatível com a vida, requerendo uma terapia de substituição renal, com vistas à retirada de excretas nitrogenadas, líquidos e eletrólitos em excesso (5).

Nessa perspectiva, compreende-se que a presença do risco de volume de líquidos deficiente em pacientes renais submetidos à hemodiálise é consequência de seu tratamento, que por meio de mecanismos de ultrafiltração propicia a perda de líquidos por vias anormais. A retirada do líquido intravascular, quando excessiva, não consegue ser compensada pelo deslocamento do líquido intersticial e intercelular, e consequentemente, desenvolve-se uma anormalidade hídrica. Nesse sentido, a ocorrência de desidratação excessiva é preocupante, tendo-se em vista o desencadeamento de um tempo de recuperação mais longo após a sessão de hemodiálise, além de acelerar a perda da função renal residual e aumentar o risco de formação de coágulo na fístula arteriovenosa ou acesso vascular (3,6-8).

Entretanto, apesar das constatações sobre o risco de desidratação na clientela estudada e das repercussões que esse problema gera à saúde do paciente, o déficit do volume de líquidos nessa clientela ainda é algo pouco estudado na literatura, em detrimento disso, a maioria dos estudos na área aborda a alta prevalência do excesso do volume de líquidos (9, 10, 11), problemática também relevante, mas que se apresenta no período interdialítico e que é resolvido nas sessões de hemodiálise.

Somado a isso, é relevante ressaltar a expressividade em termos quantitativos de pacientes renais crônicos em terapia de substituição renal no Brasil, país que em 2014 apresentou um total de 112.004 indivíduos em terapia dialítica, 20 mil pacientes a mais quando comparado ao ano de 2010. Desse total, a maioria (91,4%) realizava a hemodiálise como tratamento. Preocupante também é o número de óbitos que atingiu, apenas em 2014, 21.281 indivíduos (12).

Nesse aspecto, é importante também enfatizar que a doença renal crônica despontava em 1990 como a vigésima sétima causa de morte na população mundial, posicionamento que se modificou para a décima oitava colocação em 2010 (13), taxas que sugerem preocupação sobre essa afecção.

Destarte, torna-se necessário e relevante o desenvolvimento de estudos que sejam capazes de subsidiar um aprofundamento do conhecimento científico nessa temática. Desse modo, questiona-se: existe associação entre as características socioeconômicas e clínicas e os fatores associados ao diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente em pacientes em hemodiálise? Como objetivo, traçou-se verificar a associação entre as características socioeconômicas e clínicas e os fatores associados ao diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente em pacientes em hemodiálise.


Materiais e métodos

Trata-se de um estudo transversal, realizado em uma unidade de diálise de um hospital universitário, localizado no Nordeste do Brasil, com pacientes em tratamento hemodialítico. O referido hospital é uma instituição voltada para o ensino, pesquisa e extensão, o qual oferece leitos hospitalares, salas ambulatoriais, salas cirúrgicas, leitos de Unidade de Terapia Intensiva para adultos, Unidade de Transplante Renal, Centro de Diagnóstico por Imagem, laboratórios de Análises Clínicas e de Patologia e uma Unidade de Diálise.

A Unidade de Diálise oferece atendimento em terapia renal substitutiva do tipo hemodiálise, assim, os pacientes atendidos por meio dessa unidade são internos do próprio hospital, provenientes das enfermarias, Unidade de Terapia Intensiva e Unidade de Transplante Renal e que por motivos clínicos não podem ser encaminhados para as clínicas de hemodiálise.

A população foi composta pelo total de pacientes atendidos nessa unidade, no período de um ano, de janeiro de 2012 a janeiro de 2013, perfazendo um total de 210 pacientes, cujos dados foram extraídos a partir do sistema informatizado de registros de admissão. Para o desenvolvimento do estudo, obteve-se uma amostra de 50 pacientes, os quais se encontravam internados no referido hospital e em tratamento hemodialítico durante a pesquisa. Esse número foi alcançado a partir da aplicação da fórmula para populações finitas, por meio dos parâmetros: nível de confiança do estudo de 95% (Z= 1,96), erro amostral de 12%, população de 210 pacientes e valor conservador de 50% para a prevalência diagnóstica. O processo de amostragem empregado foi por conveniência do tipo consecutivo.

Como critérios de inclusão foram estipulados: estar internado e realizando hemodiálise no hospital do estudo; ter idade igual ou superior a 18 anos; estar consciente e orientado. Como critérios de exclusão: gestantes e pacientes em tratamento por plasmaférese.

A coleta dos dados decorreu da aplicação de um formulário de entrevista e de exame físico, o qual continha dados de identificação, dados relacionados ao tratamento e referentes ao diagnóstico em estudo. O instrumento foi validado em conteúdo e aparência por dois estudiosos reconhecidos na área da sistematização da assistência de enfermagem. As alterações propostas foram acatadas e incorporadas ao formulário.

 A entrevista e o exame físico foram realizados durante a sessão de diálise, no entanto, informações relevantes, a exemplo de dados de identificação não recordados pelo paciente ou dados atuais do tratamento clínico, foram extraídas também do prontuário durante e após a sessão. A coleta dos dados ocorreu de dezembro de 2013 a maio de 2014.

Os dados extraídos a partir da aplicação do instrumento supracitado foram organizados da seguinte forma: foram elaboradas 50 planilhas no Microsoft Office Excel 2010, cada uma contendo os dados relacionados a cada paciente, como as variáveis sociodemográficas e clínicas, como também a lista dos fatores associados ao diagnóstico RVLD, na qual foi assinalada pela pesquisadora a presença ou ausência de cada um desses fatores para o paciente em questão. Essa organização facilitou a compreensão e subsidiou a tomada de decisões de um grupo de especialistas concernente à inferência diagnóstica do Risco de volume de líquidos deficiente frente aos dados apresentados.

Para a etapa da inferência, enfermeiros diagnosticadores foram envolvidos no julgamento da presença do diagnóstico RVLD à clientela em questão. Para tanto, seis especialistas foram submetidos a treinamento com posterior avaliação de suas capacidades diagnósticas, por meio da aplicação de casos clínicos. Desse modo, três especialistas foram selecionados por apresentarem melhores resultados. Posteriormente, os diagnosticadores tiveram acesso às 50 planilhas já mencionadas para realizar a inferência diagnóstica do RVLD em cada um dos pacientes.

Para a análise e processamento dos dados, utilizou-se o pacote IBM SPSS Statistic versão 19.0 for Windows, a partir do qual se verificou a existência de associação entre as variáveis socioeconômicas e clínicas apresentadas pela clientela portadora da doença renal e dos fatores associados presentes no diagnóstico de enfermagem em questão, por meio do teste de U Mann-Whitney, com p-valor de 0,05. As variáveis socioeconômicas estudadas foram: idade, anos de estudo e renda familiar, e as variáveis clínicas foram: meses de doença renal, tempo de hemodiálise em meses, duração da hemodiálise em horas e volume de ultrafiltração. Os fatores associados analisados foram: falha nos mecanismos reguladores, perda de líquidos por vias anormais, deficiência de conhecimento, fatores que influenciam na necessidade de líquidos, extremos de peso, perda ativa de volume de líquidos, perdas excessivas por vias normais, desvios que afetam a absorção de líquidos, desvios que afetam a ingestão de líquidos e extremos de idade (indivíduos com idade superior a 65 anos).

O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais da ética em pesquisa envolvendo seres humanos. Assim, recebeu parecer favorável, sob o número 392.535, com Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) número 18710613.4.00005537. Ressalta-se que os pacientes e diagnosticadores receberam e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a coleta dos dados.


Resultados

Referente à caracterização socioeconômica da clientela, a média de idade foi de 47,23 (±14,61) anos; a média de estudo foi de 6,44 (±4,93) anos; e a renda familiar obteve média de 1,5 salários mínimos. Com relação aos dados clínicos, os meses de doença renal e tempo de hemodiálise apresentaram medianas de 64,15 e 40,68 meses, respectivamente; a duração da hemodiálise apresentou mediana de 4 horas; e o volume de ultrafiltração obteve mediana de 1,93 litros, sendo o mínimo de zero litros (sem perdas) e o valor máximo de 4,10 litros.

O diagnóstico de enfermagem RVLD esteve presente em 38 pacientes. Os fatores associados presentes nesses indivíduos diagnosticados com o Risco de volume de líquidos deficiente serão demonstrados na Tabela 1 abaixo.

Tabela 1. Distribuição dos fatores associados entre os indivíduos diagnosticados com Risco de volume de líquidos deficiente. Natal/RN, 2016

Fonte: elaboração própria.

A partir da Tabela 1, visualiza-se como fatores associados mais prevalentes para esse diagnóstico: falha dos mecanismos reguladores (100%), perda de líquidos por vias anormais (92,1%) e deficiência de conhecimento (73,6%).

Concernente à associação entre os fatores associados e as características socioeconômicas e clínicas dos indivíduos em hemodiálise, explana-se na Tabela 2 a seguir. Ressalta-se que o fator associado falha nos mecanismos reguladores não permitiu a realização de testes de associação estatística uma vez que não permite a geração de tabelas 2x2 por sua frequência hegemônica nos pacientes deste estudo.

Tabela 2. Associação entre os fatores associados do Risco de volume de líquidos deficiente e as variáveis socioeconómicas e clínicas dos pacientes submetidos à hemodiálise. Natal/RN, 2016

Fonte: elaboração própria. *Teste U Mainn-Whitney.

Verificaram-se, a partir do cruzamento, as seguintes associações significativas: deficiência de conhecimento e tempo de hemodiálise em meses (p=0,037); extremos de peso e renda familiar (p=0,040); extremos de peso e volume de ultrafiltração (p=0,010); e perda de líquidos por vias anormais e volume de ultrafiltração (p=0,000).


Discussão

O diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente obteve alta prevalência (78%) nos pacientes deste estudo. Para tanto, a verificação de quais fatores associados, inseridos nessa problemática, possuíam maior relação com os dados socioeconômicos e clínicos foi necessária, tendo-se em vista a necessidade de cuidados focados na prevenção desse diagnóstico, em virtude das complicações ocorridas na presença do volume de líquidos deficiente.

Dessa forma, o fator deficiência de conhecimento esteve presente em 73,6% da amostra, além de associar-se estatisticamente com o tempo de hemodiálise em meses. Na maioria das vezes, a deficiência de conhecimento pode estar relacionada ao nível de escolaridade, considerada baixa na amostra estudada. Tal fato pode repercutir na baixa adesão ao regime terapêutico, visto que a escolaridade deficiente pode dificultar a compreensão acerca do processo de saúde-doença, além do entendimento do tratamento a ser instituído, o qual requer intervenções específicas, complexas, e cuja obediência é fundamental à sua eficácia. Outrossim, o cumprimento do regime terapêutico é crucial na determinação da sobrevida desses pacientes, tendo em vista as complicações tanto da sobrecarga hídrica, como as repercussões negativas da retirada excessiva de líquidos (10-11,14).

Além disso, o tratamento de longa duração, ou ao longo de toda vida, é citado como fator que influencia a adesão ao tratamento, visto que a cronicidade dessa condição gera mudanças impactantes no estilo de vida do indivíduo com DRC, além de limitar consideravelmente suas atividades e restringir sua liberdade (15). Destarte, a baixa adesão ao regime terapêutico decorrente de deficiência de conhecimento age como facilitador da progressão da insuficiência renal crônica e poderá antecipar a necessidade de instituir-se a terapia dialítica, aumentando, portanto o tempo de hemodiálise em meses. Essas variáveis interferem, pois, no risco de alterações do estado hídrico dessa clientela.

No tocante à renda familiar, encontrou-se uma mediana de 1,5 salários mínimos, correspondente ao valor de R$ 1.320,00 ao se considerar o salário mínimo brasileiro vigente no ano de 2016 (R$ 880,00), caracterizando uma população com baixo nível socioeconômico. Esse resultado corrobora com diversos estudos, os quais fizeram menção à baixa renda familiar nessa clientela (9,10,16).

Neste estudo, a renda familiar associou-se estatisticamente com Extremos de peso. A literatura evidencia a relação existente entre a renda mensal e a desnutrição em pacientes submetidos à hemodiálise em centros de diálise em Belo Horizonte/Brasil. Verificou, portanto, que aqueles com renda mensal inferior ou igual a um salário mínimo apresentavam 1,6 a 4,2 mais chances de ser desnutrido. Ademais, pacientes com idade superior a 60 anos, com depressão e os aposentados possuem também maiores chances de ser desnutridos, sendo a hipertensão um fator de proteção (17).

A obesidade é outro distúrbio nutricional presente em pacientes submetidos à hemodiálise. Pesquisa aponta prevalência de 44,77% nesses pacientes, sendo mais preponderante em indivíduos do sexo feminino. Como fatores que aumentam o risco para o desenvolvimento desse problema destaca-se a baixa renda, idade superior aos 40 anos, ingestão de proteínas menor que 1,2 g/Kg/ dia e um índice de massa corporal (IMC) maior que 25 Kg/m² (18). Diante do exposto, percebe-se que a renda familiar pode influenciar no estado nutricional tanto tendendo à desnutrição quanto ao sobrepeso, conduzindo-os, assim, aos extremos de peso. 

O fator associado Extremo de peso apresentou associação significativa também com o volume de ultrafiltração. Nesse tocante, estudiosos demonstram uma associação negativa entre sobrecarga hídrica e o Índice de Massa Corporal (IMC). Desse modo, em pacientes com maior IMC foi detectada a menor ocorrência da sobrecarga de volume de líquidos. Em contrapartida, um índice de massa corporal inferior é conhecido por ser fortemente associado com o aumento da mortalidade na população em hemodiálise e particularmente naqueles com sobrecarga do volume de líquidos (11, 14, 19).

Nesse sentido, o desequilíbrio no estado hídrico desses pacientes, principalmente a sobrecarga de líquidos, demanda um aumento no volume de ultrafiltração do sangue, com vistas à retirada do líquido em excesso do organismo do paciente (14). Essa realidade poderá ocasionar o volume de líquidos deficiente nesses indivíduos.

No tocante à associação evidenciada no presente estudo entre perda de líquidos por vias anormais e volume de UF, destaca-se a própria natureza da terapia hemodialítica como produtora de alterações não fisiológicas nos fluídos corporais em decorrência de seus princípios básicos de remoção de fluídos por ultrafiltração intermitente (14). Na clientela em estudo, obteve-se uma média de volume de UF de 1,93 litros, sendo que o valor mínimo obtido correspondeu àqueles pacientes cuja hemodiálise não apresentou perdas e o valor máximo encontrado foi de 4,10 litros. Desse modo, a literatura mostra que quanto maior o volume de líquidos a ser removido em uma sessão, maior o risco da ocorrência de hipovolemia e hipotensão (14).

Estudo aponta a hipotensão como complicação mais frequente durante a sessão de hemodiálise, consequente à grande quantidade de líquidos removida do volume plasmático. No momento em que o ritmo da UF ultrapassa a capacidade de reenchimento vascular é gerada a hipovolemia e hipotensão. Além disso, a diminuição da osmolaridade do plasma a partir da remoção rápida de solutos também contribui para o problema, resultando em diminuição da pressão osmótica. Isso acarreta uma diminuição tanto no reabastecimento de fluídos do espaço extravascular para o intravascular, como provoca um deslocamento de fluídos do meio extracelular para o intracelular (20).

Diante do exposto, a identificação da associação entre os fatores associados e o diagnóstico Risco de volume de líquidos deficiente e as características socioeconômicas e clínicas subsidiará as condutas e tomadas de decisão do enfermeiro nefrologista frente à prevenção do problema de enfermagem Volume de líquidos deficiente, o qual possui repercussões graves na saúde física do paciente em hemodiálise.

Destaca-se, pois, a relevância desse tipo de estudo para o fortalecimento das taxonomias de enfermagem ao se estabelecer relações entre seus elementos constituintes e as características evidenciadas pelo paciente na prática clínica, para o qual deve ser direcionado o cuidado de enfermagem. Assim, confere-se maior grau de cientificidade ao uso dos diagnósticos de enfermagem, e consequentemente proporciona um enriquecimento à profissão.

Como limitações deste estudo, aponta-se o fato de ter sido realizado apenas com a clientela com doença renal crônica em hemodiálise, desse modo, seus resultados não podem ser extrapolados para indivíduos com outras terapêuticas. Destarte, estimula-se a realização de novos estudos que ampliem a população estudada, com vistas a contribuir para o uso dos sistemas de classificação da prática profissional.


Conclusão

A partir do presente estudo, conclui-se que há associação entre os fatores associados do diagnóstico de enfermagem Risco de volume de líquidos deficiente e determinadas características socioeconômicas e clínicas do paciente com doença renal crônica submetido ao tratamento hemodialítico. Os fatores associados mais frequentes nessa clientela, e que apresentaram associação significativa, foram extremos de peso, perda de líquidos por vias anormais e deficiência de conhecimento.

Constatou-se que os baixos níveis socioeconômicos justificam a deficiência de conhecimento, fato que poderá acarretar dificuldades de adesão à terapêutica conservadora e consequente aumento do período de terapia dialítica, expresso em tempo de HD em meses; a perda de líquidos por vias anormais está relacionada ao volume de ultrafiltração decorrente do próprio mecanismo de perdas concernente à natureza da hemodiálise; os extremos de peso mantém relação com o status hídrico do paciente e assim influenciam o volume de ultrafiltração a ser estimado; e os extremos de peso podem ser relacionados à renda familiar, a exemplo da desnutrição e obesidade, os quais são evidenciados como fatores predisponentes ao desequilíbrio hídrico em pacientes em HD.

Como limitação ressalta-se a impossibilidade de mensuração do peso seco e do ganho de peso interdialítico em todos os pacientes do estudo, tendo-se em vista que alguns pacientes apresentavam-se impossibilitados de serem pesados na balança, por não deambularem, além disso, no hospital as camas não possuíam sistema de balança, o que inviabilizou a exposição desse dado.


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